quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

ARTIGO DO AUDITOR SUBSTITUTO DE CONSELHEIRO ALIPIO REIS FIRMO FILHO É PUBLICADO NA REVISTA GOVERNET DE ORÇAMENTO E FINANÇAS

A Revista Governet publicou em sua Edição n. 81 de Janeiro de 2012 o Artigo de autoria do Auditor Substituto de Conselheiro Alipio Reis Firmo Filho intitulado CONTAS IRREGULARES E MULTA REGIMENTAL. A Revista Governet é uma Revista eletrônica que circula entre vários órgãos públicos do País. Acesse AQUI o Sumário da Revista. A seguir, publicamos a íntegra do Artigo


CONTAS IRREGULARES E MULTA REGIMENTAL



1. Introdução. 2. Prática de Atos Ilegítimos e Antieconômicos. 3. Danos justificados e danos não justificados. 4. Reincidência no descumprimento de determinação. 5. Demais irregularidades do inciso III, art. 188, do RI/TCE-AM.



1 Introdução

            O Regimento Interno do TCE-AM[1] reserva um bloco de dispositivos que regulam tanto as situações que acarretam a irregularidade das contas anuais quanto as possibilidades que ensejam a aplicação de multas (regimentais) ao gestor faltoso. As primeiras estão elencadas no inciso III, § 1º, do art. 188; as últimas, nos incisos I a V do art. 308.   
            De acordo com o inciso III, § 1º, do art. 188 do RI/TCE-AM as seguintes ocorrências levam ao julgamento pela irregularidade das contas:
            (1) a omissão no dever de prestar contas;
            (2) a prática de ato ilegal;
            (3) a prática de ato ilegítimo;
            (4) a prática de ato antieconômico;
            (5) a prática de ato com grave infração à norma legal ou regulamentar; e
            (6) a prática de ato ilegítimo ou antieconômico do qual resulte dano ao erário;
            (7) o desfalque de dinheiros, bens e valores públicos;
            (8) o desvio de  dinheiros, bens e valores públicos; e
            (9) a reincidência no descumprimento de determinação endereçada ao responsável, que ele tenha tido ciência, realizada em processo de prestação ou tomada de contas anterior.
            Dessa forma, evidenciadas nos autos qualquer uma das 09 (nove) ocorrências mencionadas, o Tribunal emitirá um juízo pela irregularidade das contas.

            De forma paralela, o art. 308 descreve outras situações que ensejam a aplicação de multa (regimental). Se fizermos um paralelo entre tais situações e aquelas  capazes de ensejar o julgamento pela irregularidade das contas,  verificaremos que apenas uma possui redação inteiramente coincidente, enquanto as demais não.
Trata-se da prática de ato com grave infração à norma legal ou regulamentar  (vide alínea “b”, última parte, do inciso III do art. 188 c/c com a alínea “a” do inciso V do art, 308). Com efeito, os atos de gestão pública que padecem desse vício  atraem sobre si tanto uma censura pela reprovabilidade das contas anuais, conduzindo-as irremediavelmente a um juízo por sua irregularidade; quanto à possibilidade de aplcação de uma penalidade pecuniária específica que, no caso, poderá flutuar no valor compreendido entre 20% a 100% daquele fixado[2] no artigo 54 da Lei n.º 2.423/96. 
Quanto às demais ocorrências relacionadas nos incisos I a V do art. 308 do RI/TCE-AM verificaremos que duas possuem redações semelhantes àquelas contidas no inciso III, parágrafo primeiro, art. 188 do RI/TCE-AM, quais sejam, a (1) prática de atos de gestão ilegítimo e antieconômico (vide alíneas “b”, primeira parte, e “c”  do inciso III do art. 188 c/c com o inciso IV do art, 308); e a (2) reincidência no descumprimento de determinação (vide alínea “e”, inciso III, do art. 188 c/c com alínea “b”, inciso III, do art, 308). Sobre tais ocorrências temos algumas considerações a fazer, dada a existência de especificidades que deverão ser observadas por ocasião de sua aplicação, conforme comentaremos em seguida.
Por último, existem ainda quatro situações que, diferentemente das situações precedentes, não estarão sujeitas à aplicação de uma multa específica, mas genérica, conforme veremos oportunamente. São elas: (1) a omissão no dever de prestar contas, (2) a prática de ato ilegal, (3) o desfalque e (4) o desvio de dinheiros, bens e valores públicos.

2 Prática de Atos Ilegitimos e Antieconômicos

            De início, é preciso deixar claro que a prática de atos ilegítimos e antiecômicos que acarretem dano ao Erário conduzem à irregularidade das contas. É o que pontua a alínea “c” do inciso III do § 1º do art. 188 do RI/TCE-AM. Mas há, ainda, uma segunda categoria de atos (ilegítimos e antieconômicos) que igualmente produzem o mesmo resultado, isto é, a reprovabilidade das contas. Tratam-se daqueles previstos na alínea “b” do inciso III do § 1º do art. 188 da norma regimental, verbis:
“Art. 188. (…)
§ 1.o Do julgamento das contas, poderá resultar que sejam consideradas:
I - (…)
II - (…)
III - irregulares, quando comprovada qualquer das seguintes ocorrências:
b) prática de ato (…) ilegítimo, antieconômico (…)”      (sem grifo no original)
            A dúvida poderá residir nas razões por que a norma regimental fez referência em duas oportunidades (e no mesmo dispositivo) à prática de atos ilegítimos e antieconómicos como ensejadores do julgamento pela irregularidade das contas. Não bastaria referir-se a eles apenas uma única vez? Indubitavelmente que sim. Todavia, não devemos ouvidar que há uma diferença substancial entre os atos mencionados. É que os atos ilegítimos e antieconómicos referidos na alínea “c” devem ser necessariamente acompanhados de um componente essencial: o dano. Sem essa qualificadora igualam-se em género e grau aos seus correlatos, dispostos na alínea “b” do dispositivo em comento. Portanto, o elemento dano é o diferencial entre uma e outra categoria de atos.
Ocorre que esta conclusão acabará por trazer um segundo questionamento, qual seja, a admissão, ainda que implícita, da existência de atos ilegítimos e antieconómicos sem dano. Ora, esta conclusão, conquanto plausível, não deixa de albergar um conteúdo, digamos, fora dos limites do que entendemos como razoável. Isto porque, a admissão da presença de atos antieconômicos que não acarretem dano à administração pública afronta, num primeiro momento, o bom senso sendo com ela a princípio incompatível. Pois bem, ainda que estejamos inclinados a concluir nesse sentido urge que nos mobilizemos noutra direção,  uma vez que tanto a jurisprudência do Tribunal de Contas da União quanto a nossa Lei Orgânica  (Lei n. 2.423/1996) os admitem.
A Lei n. 2.423/1996 faz referências expressas aos atos (ilegítimos e antieconómicos) dos quais resultam dano ao erário nos artigos 9º, 22 e 54, verbis:
“Art.9º - Diante da (…) prática de qualquer ato (…) ilegítimo ou antieconômico (…) de que resulte dano ao erário (…)
……………………………….
Art. 22 - As contas serão julgadas:
I – (…)
II – (…)
III - irregulares, quando comprovada qualquer das seguintes ocorrências:
a) (…)
b) (…)
c) dano ao erário decorrente de ato ilegítimo ou antieconômico;
…………………………
Art. 54 - O Tribunal poderá aplicar multa de até (…) aos responsáveis por:
I – (…)
II – (…)
III - ato de gestão ilegítimo ou antieconômico de que resulte injustificado dano ao erário;
(…)”      (destacamos)
A menção à segunda categoria de atos, isto é, àqueles dos quais resultam débito ao erário é encontrada no artigo 22 e parágrafo único do artigo 25, verbis:   
Art. 22 - As contas serão julgadas:
I – (…)
II – (…)
III - irregulares, quando comprovada qualquer das seguintes ocorrências:
a) (…)
b) prática de ato (…) ilegítimo, antieconômico (…)
…………………………
Art. 25 – (…)
Parágrafo Único - Não havendo débito, mas comprovada a ocorrência de que trata o artigo 22, inciso III, alínea (…), b, (…) o Tribunal poderá aplicar ao responsável a multa prevista no artigo 54, inciso I, desta Lei  (destacamos)
Esta exegese encontra-se em conformidade com o Voto proferido pelo Ministro-Relator, Marcos Vinícios Vilaça, no Acórdão n. 2804/2006, acolhido na íntegra pela Egrégia Primeira Câmara do Colendo Tribunal de Contas da União.
Naquela assentada, fora examinada Representação movida pela Juíza do Trabalho Kátia Emílio Louzada, da 6ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro.
A Representação foi acolhida, vindo a ser instaurada uma Tomada de Contas Especial cuja problemática girou em torno de reclamação trabalhista de iniciativa do Sr. Levy Bragança, ex-empregado da CBTU (Companhia Brasileira de Trens Urbanos). Na oportunidade, a empresa aceitara proposta para solver consensualmente o litígio, pagando a quantia de R$ 17.386,00 em 26/03/1996. No entanto, acabou por negligenciar o acordo ao deixar de assiná-lo, o que impediu a Justiça de homologá-lo. Desse modo, o processo judicial continuou, até que, em 13/04/2000, a Companhia foi condenada a pagar o valor de R$ 57.924,81, dos quais, segundo a sentença, deveria ser deduzida a importância já recolhida em favor do ex-empregado, para evitar o enriquecimento sem causa. Não obstante tal advertência, foi pago o valor integral da dívida, sem a dedução, tendo sido o erro atribuído ao escritório de advocacia contratado para acompanhar a causa, o qual sofreu glosa de suas faturas para reparação do prejuízo ocasionado à CBTU.
No bojo da discussão remanesceu uma questão interessante, objeto da tomada de contas especial: a antieconomicidade resultante do inaproveitamento do acordo extrajudicial, levando a CBTU a despender muito mais do que era possível para extinguir a obrigação. Debruçando-se sobre esta particularidade, assim se manifestou o eminente Relator:
“13. Sobre a configuração do débito, porém, repensei com mais serenidade o assunto e decidi voltar atrás naquilo que propugnei por ocasião do julgamento que resultou na Decisão nº 887/2002-TCU-Plenário, precursora deste processo.
14. Entendo que alguns atos antieconômicos importam dano ao erário, mas outros não. Os primeiros enquadram-se nas previsões dos arts. 8º; 16, inciso III, alínea “c”, e 58, inciso III, da Lei nº 8.443/92. E os demais incluem-se no âmbito dos arts. 16, inciso III, alínea “b”, e 58, inciso I, da mesma lei.
15. Exemplo clássico de ato antieconômico causador de dano é a aceitação de superfaturamento de preços contratuais. Entre os atos que não significam dano efetivo, está a aquisição de um equipamento com capacidade superior à necessária e, por ser assim, de preço proporcionalmente elevado.
16. A diferença entre os dois tipos de atos antieconômicos reside no discernimento do que seja um pagamento justo, do ponto de vista de quem o recebe e considerado o comportamento do gestor. Se aquele que recebe é merecedor do pagamento, na sua exata medida, e o gestor, ao se desviar da economicidade, não atuou com o propósito de beneficiar a si ou a outrem, nem de desperdiçar recursos públicos, tendo apenas sido incauto ou exagerado, compreendo que não há débito, embora se afigure exigível a aplicação da sanção de multa.
17. Do contrário, se o creditado recebe além do que lhe seria devido, ou se o ato possui o intuito de privilegiar alguém ou de deliberadamente fazer gasto supérfluo, o gestor e, quando cabível, o favorecido, em qualquer uma dessas hipóteses, responderão pelas perdas infligidas ao erário.
18. No presente caso, tenho para mim que o ato omissivo incorrido pelo ex-Chefe do Dejur está na primeira categoria acima, isto é, não foi intencional nem produziu enriquecimento injustificado do reclamante da ação trabalhista, visto que não se pode dizer que a Justiça determinou um quantum debeatur maior do que era legítimo. O responsável, sim, poderia ter reduzido a despesa, porém descurou na oportunidade que teve, o que, se não lhe retira a gravidade da culpa, por negligência, imprudência e inação, ainda é insuficiente para imputar-lhe débito pelo tanto passível de ser economizado (…)” 
(sem destaques no original)
Uma primeira dúvida poderia advir do fato de a Decisão da Corte federal levar em consideração dispositivos da Lei Orgânica do TCU – Lei n. 8.443/92 (arts. 8º; 16, inciso III, alínea “c”, e inciso III do art. 58; arts. 16, inciso III, alínea “b”, e inciso I do art. 58) -, já que os dispositivos ali invocados poderiam não ter relação com aqueles que regulam as mesmas ocorrências na Lei Orgânica do TCE-AM. No entanto, essa dúvida é inteiramente dissipada, pois os dispositivos da Lei n. 8.443/92, que sustentaram o julgado, encontram-se inteiramente reproduzidos na Lei n. 2.423/1996, verbis:  
Art. 8° Diante da (…) prática de qualquer ato (…) ilegítimo ou antieconômico de que resulte dano ao erário, (…)
……………………..
Art. 16. As contas serão julgadas:
I – (…)
II – (…)
III - irregulares, quando comprovada qualquer das seguintes ocorrências:
a) (…)
                    b) prática de ato de gestão (…) ilegítimo, antieconómico (…)
                    c) dano ao erário decorrente de ato de gestão ilegítimo ao antieconômico;
……………………..
Art. 58. O Tribunal poderá aplicar multa de (…) aos responsáveis por:
I – (…)
II – (…)
       III - ato de gestão ilegítimo ou antieconômico de que resulte injustificado dano ao erário;
……………………….
       Art. 19. (…)       
       Parágrafo único. Não havendo débito,    mas comprovada qualquer das ocorrências previstas nas alíneas (…) b e c do inciso III, do art. 16, o Tribunal aplicará ao responsável a multa prevista no inciso I do art. 58, desta lei.
                                   (destacamos)
Portanto, a exegese emprestada aos dispositivos da Lei Orgânica da Corte Federal de Contas é perfeitamente aplicável aos seus correlatos, contidos na Lei Orgânica do TCE-AM.
Pois bem, a partir das considerações expendidas pelo Ministro-Relator, é possível extrairmos algumas características importantes para identificarmos os atos antieconômicos que não importem dano ao erário. Contudo, é preciso levar em consideração que tais características devem se apresentar de forma cumulativa  em cada caso analisado, sob pena de o ato, ainda que eivado de antieconomicidade, não acarretar dano aos cofres públicos.  
Conforme pontuou em seu Voto, uma das variáveis a serem consideradas nesse exame reside na presença ou não de enriquecimento injusto do beneficiário do ato. No caso em comento, efetivamente esse elemento não se fez presente, muito embora a administração pública, aqui representada pela CBTU, pudesse realizá-lo de forma mais econômica. O fato é que, ao não fazê-lo, ela acabou por legitimá-lo e, no dizer do Ministro-Relator, “tornou o beneficiário merecedor do pagamento na sua exata medida”, ainda que não lhe excluísse a mancha da antieconomicidade.
Pois bem, constatada a presença desse elemento – enriquecimento injusto do beneficiário – teremos de adicionar um outro componente que, igualmente, deverá ser considerado no processo de identificação de tais atos.
Trata-se da possibilidade de o gestor público poder optar pela prática do ato de outra forma, atingindo o objetivo pretendido, mas de maneira mais econômica para os cofres públicos. Indubitavelmene, esse componente se fez presente no caso em análise. Para tanto, bastava que a CBTU assinasse o acordo judicial homologatório, notadamente de contornos mais favoráveis aos cofres públicos. Não o fazendo, acabou por prejudicá-los, produzindo um dano incontinente.    
Como último requisito, é preciso que o gestor atue, ao se desviar da economicidade, com o propósito de beneficiar a si ou a outrem, assim como com o firme propósito de desperdiçar recursos públicos, podendo ser tido como incauto ou exagerado. Ora, pelo teor do julgado não podemos afirmar que esse requisito existiu, muito embora patente a negligência de seu autor, materializado na perda do prazo para homologar um acordo judicial mais benigno. 
        Em síntese, para que um ato ilegítimo ou antieconômico acarrete dano ao erário é imperioso que, cumulativamente, façam-se presentes os seguintes elementos:
1-       o ato deve provocar o enriquecimento injusto de seu beneficiário;
2 - possibilidade de o ato ter sido praticado de outra forma, atingindo o objetivo pretendido, mas de maneira mais econômica para os cofres públicos;
3 – o ato antieconômico praticado deve ter beneficiado o seu autor ou  terceira pessoa, com o firme propósito de desperdiçar recursos públicos.

3 Danos justificados e danos não justificados

Constatada a prática de atos ilegítimos e antieconómicos que acarretem dano ao erário é possível que seu autor venha a justificar a sua prática com argumentos plausíveis e convincentes (em razão da prova de que o ato foi praticado em decorrência de caso fortuito ou força maior, por culpa exclusiva da Administração, devido a um estado de necessidade ou, ainda, por creditá-lo a um fato de terceiro). Esse, aliás, o fundamento maior dos Princípios do Contraditório e da Ampla Defesa, que possibilitam ao acusado oferecer a sua versão a respeito de suposta irregularidade por ele praticada. Ora, em tais casos, não será possível aplicar a multa prevista no inciso IV do art. 308 do RI/TCE-AM uma vez que, repetimos, o agente público logrou justificar o ato praticado. Não há sentido algum, pois, impor-lhe uma sanção. Trata-se, portanto, de um típico ato causador de dano plenamente justificado. Entretanto, conquanto a justificativa seja plausível, remanesce um dano aos cofres públicos que não merece e não pode ser ignorado.
Lembremos que o responsável justificou o ato antieconômico por ele praticado, mas não a sua consequência (o dano em si). O que desapareceu foi a pena, não a parcela do Patrimônio público violado. Em razão disso, suas contas não podem passar sem qualquer censura no âmbito do Órgão julgador. Ora, prevendo a ocorrência de tais situações, a norma regimental acabou por tipificá-las na alínea “c” do inciso III, parágrafo primeiro, de seu art. 188 (prática de ato ilegítimo ou antieconômico do qual resulte dano ao erário) ensejando o julgamento pela irregularidade das contas. Esta, aliás, a razão por que, em tais hipóteses, a norma regimental exige que cópia do processo seja remetida ao Ministério Público Ordinário para ajuizamento das ações competentes (alínea “b”, inciso III, do art. 190).
            Todavia, a possibilidade de as justificativas oferecidas pelos responsáveis virem a ser acolhidas pelo  Órgão de Controle Externo é apenas uma das duas alternativas igualmente possíveis.
Situações há em que os responsáveis não obtém êxito nesse seu propósito, isto é, não conseguem justificar a ocorrência do dano. Por conta disso, sujeitam-se à incidência da pena prevista no inciso IV do art. 308 do RI/TCE-AM (ato de gestão ilegítimo ou antieconômico de que resulte injustificado dano ao erário). Mas não apenas isso. À maneira da situação anterior, restou configurado um dano ao erário que, igualmente, conduzirá à irregularidade das contas anuais, uma vez que tipificada a ocorrência contida na alínea “c” do inciso III, parágrafo primeiro, de seu art. 188 (prática de ato ilegítimo ou antieconômico do qual resulte dano ao erário). Nesse particular, poder-se-á fazer a seguinte ilação: o responsável será apenado duas vezes? Não. O julgamento das contas pela irregularidade não se constitui numa sanção, mas numa avaliação da forma como o gestor público conduziu a administração dos bens e valores postos sob sua responsabilidade num determinado período de tempo. O julgamento das contas consiste, essencialmente, na avaliação da gestão como um todo não possuindo, portanto, qualquer conotação sancionatória.  

4 Reincidência no descumprimento de determinação

            A reincidência no descumprimento de determinação do Tribunal faz incidir sobre o responsável a multa prevista na alínea “b”, inciso III, do art. 308 do RI/TCE-AM[3]. Todavia, se a determinação tiver sido veiculada em processo de prestação ou tomada de contas anterior, o comportamento faltoso ocasionará, adicionalmente, o julgamento pela irregularidade das contas, conforme dispõe a alínea “e”, inciso III, do parágrafo primeiro, do art. 188 do RI/TCE-AM. Porém, para melhor compreensão do alcance de tais dispositivos faz-se necessário alguns esclarecimentos.
Note-se que a reincidência  pode provocar duas consequências jurídicas relevantes, sendo uma na avaliação das contas anuais e outra em grau de sanção. Dissemos “pode” porque não é toda e qualquer reincidência que ocasiona a irregularidade das contas, mas unicamente se a determinação descumprida houver nascido na avaliação de um  processo de prestação ou tomada de contas  referente a um exercício anterior. Esse aspecto é deveras importante já que se constitui numa condição sine qua non para a reprovabilidade das contas anuais em avaliações futuras.  A dúvida é saber por que o legislador não elegeu  idêntido requisito para a aplicação da multa regimental. A resposta é simples.
Boa parte dos regimentos internos dos Tribunais de Contas em nosso País foram inspirados em normas regimentais provenientes de organismos de controle externo que adotam duas categorias de processos: um processo de contas anuais e um processo de fiscalização. O processo de contas anuais, conforme todos sabemos, são processos nascidos no âmbito das unidades jurisdicinadas; por elas são constituídos e posteriormente encaminhados ao Tribunal de Contas respectivo para julgamento[4]. Já os processos de fiscalização, diversamente, nascem no interior das Cortes de Contas e têm origem nas auditorias e inspeções por elas realizadas[5].
Muito embora os processos de fiscalizacão possuam ritos processuais próprios e autônomos, movimentam-se sempre em direção ao processo de contas anuais – processo principal -, já que a massa de informações neles depositadas servirão como subsídio na avaliação destas últimas. Ora, da mesma forma que nos processos de contas anuais, também nos processos de fiscalização haverão sempre pontos controvertidos que deverão ser levados ao conhecimento dos responsáveis para a apresentação de justificaivas, mediante os institutos do contraditório e da ampla defesa. Sendo assim, caso se verifique em tais processos alguma irregularidade configuradora da prática de reincidência no descumprimento de determinação (do Tribunal), haverá a incidência da sanção prevista na na alínea “b”, inciso III, do art. 308 do RI/TCE-AM, pouco  importando se o seu destinatário tiver tido ciência da determinação num processo de contas anterior ou num processo de fiscalização outrora realizada. A incidência do dispositivo é, portanto, imediata bastando, para tanto, que o ato infrator subsuma-se inteiramente à previsão regimental.
Por outro lado, as contas não poderão ser reprovadas em razão de reincidência no descumprimento de determinação de que o responsável tenha tido ciência, feita em processo de fiscalização, ainda que esta tenha sido realizada em período anterior. Em tais condições, somente ocorrências de natureza diversa poderão sustentar a reprovabilidade das contas anuais.    
 .                 
5 Demais irregularidades do inciso III, art. 188, do RI/TCE-AM

            Na inicial destes nossos comentários relacionamos todas as ocorrências que conduzem ao julgamento pela irregularidade das contas. Destas, apartamos algumas, que mereceram considerações específicas dada as suas particularidades. Remascereram outras que, agora, serão objeto de nossas considerações. São elas:
            - a omissão no dever de prestar contas;
            - a prática de ato ilegal;
            -  o desfalque de dinheiros, bens e valores públicos; e
            - o desvio de  dinheiros, bens e valores públicos.
            Continuando a fazer um paralelo entre a natureza de tais ocorrências e aquelas relacionadas nos incisos I a V do art. 308, motivadoras da aplicação de multa regimental, verificaremos, de pronto, que nenhuma delas encontra-se explicitamente prevista nos mencionados dispositivos. De outra parte, há duas infrações referidas nos mencionados incisos que, muito embora atraiam a possibilidade de apenação dos responsáveis, não conduzem à irregularidade das contas. São elas: a obstrução ao livre exercício das inspeções e auditorias determinadas (alínea “a”, inciso III); e o não cumprimento, de forma injustificada, à  decisão do Tribunal (alínea “b”, inciso V).
            Nesse contexto, a primeira observação que temos a fazer é que, conquanto não haja referência expressa (no quadro geral das multas regimentais) às infrações ensejadoras da reprovabilidade das contas, existe uma multa regimental genérica prevista no inciso II do art. 308 do RI/TCE-AM, cujo montante poderá ser fixado num valor compreendido entre cinco a cinquenta por cento do valor máximo regimental fixado. Dizemos “genérica” porque ali não está discriminada qualquer irregularidade específica que sustente a aplicabilidade da sanção corresponente. O inciso fala apenas de “contas julgadas irregulares que não resulte débito ao erário”. E quais são essas irregularidades? A nosso ver, as quatro ocorrências outrora aludidas: (1) a omissão no dever de prestar contas, (2) a prática de ato ilegal, (3) o desfalque e (4) o desvio de dinheiros, bens e valores públicos, uma vez que para as demais, consoante comentamos, haverá sempre uma correspodente sanção específica no quadro geral das multas regimentais.  
            Note-se que a faixa de incidência do valor a ser aplicado a título de multa em tais situações é superior àquela prevista, p. exemplo, no inciso III do art. 308. Enquanto esta última poderá variar num percentual de dez a vinte por cento, aquela flutuará entre cinco a cinquenta por cento. A diferença de tratamento decorre exatamente do fato de a gravidade das irregularidades referidas no inciso II ser superior - em grau e substância – àquelas descritas no inciso III. Uma simples leitura do teor de ambos os dispositivos nos remeterá a esta conclusão. Vejamos.
            Para vir a sofrer a incidência da multa prevista no inciso II do art. 308, conforme dissemos, deverão estar configuradas nos autos, total ou parcialmente, qualquer uma das ocorrências mencionadas (a omissão no dever de prestar contas, a prática de ato ilegal, o desfalque e o desvio de dinheiros, bens e valores públicos). Entretanto, para a incidência da multa tipificada no inciso III do mesmo artigo há que ficar patente a ocorrência de obstrução ao livre exercício das inspeções e auditorias determinadas (alínea “a”); e/ou a reincidência no descumprimento de determinação do Tribunal (alínea “ b”). Ora, basta que comparemos a natureza das duas categorias de irregularidades para concluírmos que a primeira guarda contornos nitidamente mais gravosos que a segunda, a exemplo da omissão no dever de prestar contas que agride um dos princípios fundamentais insculpidos na Carta Magna[6]. Daí, a propósito, o tratamento mais severo reservado para esse grupo de irregularidades.   
            Essa, a meu sentir, a exegese mais apropriada a ser emprestada aos dispositivos em comento.




















BIBLIOGRAFIA

AMAZONAS. Lei n. 2.423, de 10 de dezembro de 1996. Dispõe sobre a Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado do Amazonas e dá outras providências. Diário Oficial do Estado do Amazonas, Manaus, AM, n. 28.580, p.01 - 09, 10 de dezembro de 1996.
___________. Resolução n. 04, de 23 de maio de 2002. Dispõe sobre o Regimento Interno do Tribunal de Contas do Estado do Amazonas e do Ministério Público junto ao TCE-AM. Diário Oficial do Estado do Amazonas, Manaus, AM, n. 28.580, p.02 - 32, 27 maio de 2002.
BRASIL. Lei n. 8.443, de 16 de julho de 1992. Dispõe sobre a Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, n. 136, p.9449-9456, 17 de julho de1992, Seção 1.
_______. Constituição federal, coletânea de legislação de direito ambiental / organizadora Odete Medauar; obra coletiva de autoria da Editora Revista dos Tribunais, com a coordenação de Giselle de Melo Braga Tapai. - 3. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004 – (RT-mini-códigos).
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO: banco de dados: Disponível em <http://www.tcu.gov.br>.
                                                                                  


[1] Resolução/TCE-AM n. 04/2002.
[2] Conforme Resolução/TCE-AM n. 001, de 29/01/2009.
[3] Dez a vinte por cento do valor fixado no caput do art. 308 do RI/TCE-AM.
[4] Os processos de contas anuais são regulados nos arts. 182/194 no RI/TCE-AM.
[5] Em nosso Regimento Interno as fiscalizações estão previstas no art. 201.
[6] Alínea “d”, inciso VII, art. 34.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

O QUE FAZ O MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS? (3)


O Ministério Público de Contas é um órgão especial, da mesma forma que os Ministérios Públicos da Justiça Eleitoral, da Justiça Trabalhista e da Justiça Militar. Ele é especial porque, assim como aqueles, é um órgão especializado numa matéria: contas públicas. Sua atividade gira em torno desse objeto e ela será iniciada tão-logo a Secex finalize o seu trabalho. Vejamos mais detalhes.

Após a Secex se pronunciar sobre o processo ele seguirá para o Ministério Público de Contas - MPC. A Função do MPC é semelhante ao do Ministério Público ordinário: atuar como fiscal da lei. Sua responsabilidade será velar pelo bom cumprimento das normas que incidem sobre os fatos contidos no processo. Por isso, seu ponto de vista será eminentemente jurídico.

Ao analisar os elementos contidos no processo de prestação de contas o MPC gozará da prerrogativa de livre convencimento, sem qualquer peia, limitação ou constrangimento. Gozará ele de plena autonomia em sua atuação podendo seguir a linha de entendimento que melhor se afigure. Em decorrência, poderá concordar ou não com o entendimento da Secex, total ou parcialmente. Exemplifiquemos.

Digamos que a Secex aponte 10 (irregularidades) em seu relatório. O MPC poderá acolher algumas delas, todas elas ou nenhuma delas além de poder acrescentar outras. Sua conclusão decorrerá única e exclusivamente de seu ponto de vista sobre a matéria analisada.

Se o MPC não acolher alguma irregularidade apontada pela Secex, ela deixará de prevalecer? Não. As duas opiniões, embora conflitantes, serão válidas e não se excluirão do processo. Elas continuarão nele e servirão  de subsídio para que o Relator manifeste a sua opinião. 
    
 É o que veremos em nosso próximo comentário.         

domingo, 5 de fevereiro de 2012

ACABEI DE ASSUMIR UMA FUNÇÃO PÚBLICA. POSSO SER RESPONSABILIZADO POR IRREGULARIDADES PRATICADAS POR MEUS ANTECESSORES?

Sem dúvida nenhuma. Vejamos a seguinte situação.
No exercício X1 houve três administradores à frente de determinado órgão. O primeiro ficou de 01/01 a 31/03; o segundo de 01/04 a 30/09 e o terceiro de 01/10 a 31/12.
Admitamos que o primeiro gestor tenha deixado de enviar ao tribunal os seus balancetes mensais. O segundo gestor assumiu e também não apresentou os balancetes gerados em sua gestão, além de também não ter encaminhado os balancetes relativos à administração de seu antecessor. O terceiro gestor, por sua vez, ao contrário de seus antecessores, apresentou os balancetes referentes ao período de sua administração mas, como aqueles, também não se preocupou por enviar os balancetes dos meses anteriores, isto é, os relativos às gestões de seus antecessores. Questionamos: o terceiro gestor pode ser responsabilizado ou somente os dois primeiros? Respondemos: todos os gestores podem ser responsabilizados solidariamente. Alguém pode questionar: mas o último gestor prestou contas de sua gestão, religiosamente?! Bem, ocorre que durante os três períodos considerados houve uma conduta omissiva por parte dos três gestores e não apenas dos dois primeiros. Vejamos.
                O primeiro gestor foi omisso quanto aos balancetes gerados em sua gestão, o mesmo ocorrendo com o  segundo. A situação deste último, contudo, possui um agravante já que ele também deixou de encaminhar os balancetes da gestão passada. O terceiro gestor, entretanto, conquanto tenha sido diligente ao encaminhar os balancetes de sua própria gestão, não o fez no tocante às peças contábeis relativas a de seus dois antecessores. Omitiu-se, portanto, podendo vir a responder solidariamente com os demais por essa lacuna de informação.
                Em suma, as condutas omissivas praticadas por um gestor poderão ser imputadas ao novo gestor caso também ele permaneça em silêncio. Essa conclusão guarda correlação com o conceito de irregularidade que, de acordo com o inciso IV do artigo 7º da Lei Orgânica do Tribunal (Lei n. 2.423/96), corresponde a uma conduta ativa ou omissiva contrárias à legalidade, legitimidade, economicidade, moralidade administrativa ou ao interesse público.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

O QUE FAZ A SECRETARIA DE CONTROLE EXTERNO? (2)

A Secex é o primeiro órgão dos tribunais de contas a ter contato com as prestações de contas. Após chegarem aos tribunais, elas são encaminhadas à Secex para análise. Nessa análise a unidade irá apontar algumas lacunas, dúvidas nas informações, ausência de documentos etc. Seu objetivo é fazer um primeiro apanhado do processo. Ao final, ela produzirá um relatório preliminar. Ele é chamado de preliminar por dois motivos: primeiro, porque os pontos por ela suscitados deverão ser esclarecidos pelo gestor; segundo porque, paralelamente, a Secex fará uma visita “in loco” nas dependências da repartição, a fim de colher mais elementos e confrontá-los com as informações constantes na prestação de contas. Aqui nascem as auditorias e inspeções dos tribunais de contas. É através delas que esses órgãos fazem um diagnóstico da gestão. Isso ocorre no início do primeiro semestre do ano subsequente àquele que se referem as contas. Exemplificativamente: se a prestação de contas referir-se a 2010, as auditorias e inspeções serão realizadas no início do primeiro semestre de 2011.

Nessa fiscalização os tribunais de contas podem ver o que quiserem: licitações e contratos, convênios, despesas com o quadro de pessoal, patrimônio (almoxarifado, bens móveis, imóveis etc.), construções e reformas, etc. Mas há um limitador. Somente não entrará nesse processo fiscalizatório os recursos federais (no caso de auditorias e inspeções realizadas pelos tribunais de contas estaduais e dos municípios). Por outro lado, o Tribunal de Contas da União não poderá auditar recursos estaduais e/ou municipais. Apenas os federais. É uma regra contida nas Constituições federal e estadual.

Ao término da fiscalização os dados e informações coletados serão juntados àqueles provenientes da análise preliminar realizada pela Secex. Após, todos eles serão reunidos num bloco só e encaminhados ao gestor para que ele esclareça os pontos controvertidos. Esses pontos são tecnicamente conhecidos como Achados de Auditoria. Aqui nasce a comunicação processual. Ela é um documento que os tribunais de contas elaboram e onde colocam todos os achados, isto é, as irregularidades identificadas solicitando ao administrador público que as esclareça, ou seja, que faça as contestações que entender necessárias dentro de um prazo pré-estabelecido. É a fase do Contraditório e da Ampla Defesa.

Ao ser questionado o administrador público poderá assumir dois comportamentos: não responder às indagações ou apresentar defesa[1].

Caso ele prefira não responder às indagações será considerado revel pelo tribunal. A revelia trará consequências jurídicas negativas para o gestor. Ela significará que, implicitamente, ele concorda com todas as irregularidades levantadas pelo tribunal contra si. É um reconhecimento tácito de culpa. Isso significará que o tribunal poderá julgar as suas contas irregulares, determinar a devolução de recursos e aplicar sanções (a mais comum das sanções é a aplicação de multa).

Mas o gestor poderá optar pela apresentação de defesa. Através dela ele tentará refutar cada uma das irregularidades apontadas pelo tribunal de contas. Para tanto, poderá juntar novos documentos aos processos, esclarecer pontos obscuros, enfim, contradizer tudo o que foi dito pela Secex. De posse desses esclarecimentos a Secex procederá à nova análise no processo. De sua análise poderá resultar que:

a) os esclarecimentos oferecidos pelo responsável foram suficientes para sanar todas as irregularidades; e
b) só parcialmente a defesa apresentada saneou o processo restando ainda irregularidades não suficientemente esclarecidas.

Na primeira hipótese a Secex opinará pela regularidade ou regularidade com ressalvas das contas. Estas últimas acompanhadas ou não de determinações ao órgão.

Na segunda hipótese a Secex opinará pela irregularidade das contas podendo, ainda, propor a glosa dos recursos e a aplicação de multa aos responsáveis. Em situações bem particularizadas é possível que as irregularidades remanescentes não sejam robustas o suficientes para conduzir à reprovação das contas. Nesses casos, poderá ser admitida a propositura de regularidade com ressalvas das contas seguidas de determinações. 

Qualquer que seja o comportamento do gestor – apresentar defesa ou permanecer como revel - A Secex elaborará um novo relatório, desta vez chamado de relatório conclusivo. Nele, a unidade colocará todos os seus pontos de vista a respeito da prestação de contas apresentadas pelo gestor. Elaborado o relatório conclusivo, finalizam-se os trabalhos a cargo da Unidade. A etapa seguinte será submeter o processo à apreciação do Ministério Público de Contas. Mas esse será o tema de uma futura abordagem.


[1] Haverá, ainda, um terceiro comportamento que o gestor poderá assumir: recolher algum valor glosado pelo tribunal, a fim de habilitar-se ao saneamento de suas contas. Por ser um assunto que reclame um tratamento particularizado, comentaremos esse tema em nossa próxima abordagem.

SUPREMO MANTÉM PODERES DE INVESTIGAÇÃO DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

O BRASIL AGRADECE: LEIA A ÍNTEGRA DA REPORTAGEM

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

COMO OS TRIBUNAIS DE CONTAS FUNCIONAM (1)

Desde quando comecei a trabalhar com auditorias governamentais (anteriormente como técnico do Tribunal de Contas da União, agora como Auditor Substituto de Conselheiro no Tribunal de Contas do Estado do Amazonas) tenho observado que tanto o grande público quanto muitas entidades (sindicatos, associações, a imprensa em geral, organizações não governamentais e outros) desconhecem como funcionam os Tribunais de Contas no Brasil. Raras são as reportagens que não “atropelam” a real forma como os Tribunais de Contas conduzem as suas atividades. E disso resultam algumas conclusões equivocadas que infelizmente traduzem  uma realidade que não condiz com a rotina desses órgãos.  São raras as reportagens que abordam acertamente o tema. Por isso decidi escrever algo a respeito aqui no Blog.

Para um primeiro início de conversa, é preciso deixar claro que os tribunais de contas são como edifícios que possuem 04 (quatro) andares. Cada um desses andares possui uma função específica no processo de fiscalização e julgamento das contas dos administradores públicos. O quarto andar é responsável pelo julgamento das contas (a mais importante de todas as funções). Os três primeiros andares são responsáveis pela preparação das prestações de contas para serem apreciadas pelo quarto andar. Note que o quarto andar somente irá desempenhar suas funções (julgamento das contas) após os três primeiros desenvolverem as suas. Há, portanto, uma interdependência das funções. Eles trabalham em conjunto. Se os três primeiros andares atrasarem o seu trabalho também haverá atraso no trabalho a cargo do quarto andar.

E em que consiste o trabalho dos três primeiros andares? Eles perseguem basicamente  dois objetivos: retiram dúvidas processuais e suprimem lacunas de informações porventura existentes nos processos de prestação de contas. Tecnicamente, esse procedimento é conhecido como saneamento dos autos.

Para entender isso é preciso que se tenha em mente que quando uma prestação de contas ingressa no tribunal ela apresenta algumas falhas. Para usar um termo popular, é como se ela entrasse “crua”. Na ótica do prestador de contas ela (as contas) já estará “pronta” para ser julgada, mas isso pode não ser verdade (e normalmente é o que acontece). Quando o tribunal começa a analisá-la normalmente surgem dúvidas e lacunas que precisam ser esclarecidas pelo prestador de contas. Sem isso não será possível o seu julgamento.

Quem são os quatro andares que estamos nos referindo? Vejamos:

- o quarto andar é ocupado pelo Tribunal Pleno;
- o terceiro andar é ocupado pelo Relator das contas;
- o segundo andar é ocupado pelo Ministério Público de Contas;
- o primeiro andar (andar térreo) é ocupado pela Secretaria de Controle Externo (que normalmente adota a sigla “SECEX” nos tribunais de contas).

Essa é estrutura existente em todos os tribunais de contas do Brasil (ao todo 34 tribunais de contas). Conforme dissemos, os três primeiros andares (Secex, Ministério Público de Contas e Relator) atuam no sentido de retirarem dúvidas e lacunas de informações porventura existentes no processo de prestação de contas enquanto o Tribunal Pleno é o responsável por seu julgamento. No Tribunal de Contas do Estado do Amazonas não é diferente.

O que são Secex, Ministério Público de Contas e Relator? Vamos responder essas questões nos próximos textos que pretendemos publicar ainda neste mês de fevereiro aqui no Blog.