sexta-feira, 4 de novembro de 2016

QUAL A DIFERENÇA ENTRE EMPRESA ESTATAL DEPENDENTE E EMPRESA ESTATAL CONTROLADA?

Não é raro encontrarmos alunos confundindo os conceitos de "empresa estatal dependente" e "empresa estatal controlada".

A rigor, não há muita semelhança entre ambos os conceitos. Mas talvez por serem conceitos ligados  às empresas estatais, os conteúdos acabam se entrelaçando e produzindo dúvidas na cabeça dos estudantes. 

A definição do que vem a ser uma empresa estatal dependente consta no inciso III, do art. 2º, da Lei Complementar 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal). Segundo esse dispositivo, empresa estatal dependente é aquela que recebe do ente controlador (União, estados, DF ou municípios) recursos financeiros para pagamento de despesas com pessoal ou de custeio em geral ou de capital, excluídos, no último caso, aqueles provenientes de aumento de participação acionária.

É importante destacar que o conceito deixa transparecer uma incapacidade da empresa estatal sustentar suas atividades com recursos próprios. Ou seja, a receita proveniente de suas vendas (de bens ou da prestação de serviços) não dá para cobrir as despesas da folha de salários de seus empregados ou para o pagamento de despesas com sua manutenção, como as despesas de água, energia elétrica, conservação, limpeza, etc. É possível também que os recursos que a empresa dispõe também não sejam suficientes para investir em projetos ligados à sua atividade principal e/ou acessória. É como se ela precisasse de uma "mesada" todos os meses de seus "pais" (o ente controlador) para sobreviver. Ela é, portanto, carente de recursos próprios. 

Imaginemos uma empresa estatal que preste serviços de transporte. Seu faturamento mensal é de 2 milhões de reais. Todavia, sua folha de salários, acrescida das outras despesas de manutenção alcança a cifra de 4 milhões de reais. Se depender apenas de seu faturamento, essa empresa não tem como sobreviver no mercado, continuando a prestar o seu serviço. Ela, então, necessita de um aporte adicional de recursos todos os meses - de, pelo menos, 2 milhões de reais - para fazer frente às suas despesas de manutenção. De onde vem esse dinheiro? Do orçamento do ente que a controla. Se for uma empresa federal, da União; se for uma empresa estadual ou municipal, do respectivo estado ou município controlador. Esse recurso será alocado no orçamento fiscal do ente (sabemos que os orçamentos públicos são três: fiscal, seguridade social ou de investimento das estatais) e transferido, por ocasião da execução do orçamento, para a empresa dependente. Em razão disso, a empresa estatal destinatária dos recursos figurará no orçamento fiscal do ente que a controla, como se fosse um órgão da administração direta. 

Por sua vez, o conceito de empresa estatal controlada também está na Lei de Responsabilidade Fiscal, no inciso II do art. 2º da Lei:  sociedade cuja maioria do capital social com direito a voto pertença, direta ou indiretamente, a ente da Federação.

Note que o conceito não tem nada a ver com dependência financeira. Ou seja, se a empresa tem ou não capacidade de se manter com os recursos provenientes de seu faturamento. Ele se põe em relação ao controle acionário da entidade estatal. Vamos entender melhor isso?

No Brasil, há duas modalidades de ações: as ações ordinárias e as ações preferenciais. Portanto, quem compra ações de uma empresa (estatal ou não) será titular de uma ou outra categoria ou, ainda, de ambas, caso decida investir na aquisição de ações representativas das duas modalidades. 

As ações preferenciais não dão ao seu titular o direito de votar nas assembleias. Essa prerrogativa é própria de quem possui ações ordinárias. Portanto, só os titulares das ações ordinárias têm a capacidade de proferir sua opinião durante as assembleias realizadas pela alta direção da empresa. É o poder de votar. Seu voto pode, inclusive, decidir os rumos que ela pode tomar. Com efeito, quem tem a maioria das ações ordinárias, isto é, as com direito a voto, tem maior poder de decisão que os demais. Agora, imagine que o titular da maioria das ações com direito a voto seja o poder público, isto é, a União, cada estado da Federação, o DF ou cada município? Ele, sozinho, irá decidir os rumos da empresa estatal, correto? Como ele é titular da maioria das ações ordinárias, seu voto será sempre majoritário. Pois bem. É nesse sentido que o conceito da Lei de Responsabilidade Fiscal deve ser entendido. 

Diante disso, podemos ter uma empresa estatal controlada mas não dependente  (Banco do Brasil, Petrobrás, Caixa Econômica Federal) e empresas estatais controladas mas dependentes (Embrapa).  

  


2 comentários:

  1. Professor, estou estudando AFO, e devido a algumas questoes de prova, entrei no google para procurar as respostas e me deparei com seu link. Num deles , vc explicou de forma cabal o motivo de classificarmos em Inversao Financeira ( e nao de Investimento) o ato de aquisição de títulos representativos do capital de empresas do SETOR TERCIARIO.
    Devido a otima resposta, acabei pesquisando e chegando ate aqui.

    Caso nao seja abusar, gostaria saber pq o aumento da participacao acionaria de uma empresa dependente nao classifica especificamente para essa despesa, como despesa de capital para o ente controlador ?

    Obrigado.
    Abc

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    1. Olá!! Vejamos. Conforme me referi no artigo, todas as despesas correntes e de capital das empresas estatais devem ser financiadas com a receita proveniente da venda de bens ou da prestação de serviços por parte de uma empresa estatal. Não faz sentido constituir uma empresa para ser "sustentada" pelos entes que a criaram (União, estados, municípios). Se a regra fosse ela, melhor seria atribuir o objeto social da empresa a um órgão público. Contudo, vimos que, às vezes, o objeto explorado pela empresa é estratégico socialmente e economicamente falando sem, contudo, haver o correspondente faturamento no setor privado. O resultado é que, dada essa importância sócio-econômica, o ente controlador terá que fazer de tudo para fazer com que o negócio não pare, pois se parar haverá prejuízos irreparáveis para a sociedade ou para a economia. Na hipótese dos aumentos na participação acionária isso não está inserido nesse contexto. O aumento é uma operação puramente decorrente de uma relação "criatura-criador" (não sei se você me entende). É uma operação puramente de relação empresarial. Mercantil. Financeira. Chame do que chamar. Portanto, ela não está relacionada diretamente à importância sócio-econômico da empresa com o seu meio. A decisão por elevar a participação acionária é uma decisão puramente do ente controlador. De sua intimidade, de sua discricionariedade. Talvez por isso o legislador excluiu a classificação desses recursos como elemento característico de sua dependência. Aliás, esse tipo de injeção de recursos ocorre tanto nas empresas dependentes quanto nas não dependentes. Não é exclusiva das primeiras. Abraço!!

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